É o filme francês, e independente, mais caro de sempre (197 milhões de euros), com forte participação de capital chinês, todo rodado em estúdio em França. E apesar de adaptar ao cinema uma banda desenhada (BD) de ficção científica (FC) francesa, Valérian e Laureline, criada na revista Pilote por Jean-Claude Mézières e Pierre Christin faz agora 50 anos, Luc Besson rodou Valérian e a Cidade dos Mil Planetas em inglês, com um americano (Dane DeHaan) no papel de Valérian e uma inglesa (Cara Delevingne) no de Laureline, para entrar no maior número de mercados possível, incluindo o americano.
Ou seja: Besson usou exactamente as mesmas armas e estratégias económicas, comerciais, tecnológicas e narrativas que Hollywood, para a desafiar no seu próprio terreno. Valérian e a Cidade dos Mil Planetas apresenta-se assim como a mais poderosa e elaborada arma criada até agora na Europa para enfrentar o colosso americano no mercado cinematográfico global.
Os fãs da BD de Mézières e Christin não ficarão desiludidos com o filme. Besson transpôs para a tela com aceitável sucesso o seu complexo e variadíssimo universo gráfico, das paisagens cósmicas à multiplicidade de espécies alienígenas que as povoam e nelas convivem, bem como locais como o Point Central, a estação espacial-mundo, sem esquecer algumas das personagens recorrentes da série, como o trio Shingouz ou o Transmutador de Bluxte, que aqui têm outros nomes e se adaptam às necessidades do argumento.
A maior vulnerabilidade de Valérian e a Cidade dos Mil Planetas reside nos dois actores principais. Apesar dos seus 31 anos, Dane DeHaan tem ar de muito mais novo, e nem por sombras é Valérian, nem na idade, nem no aspecto e muito menos na maneira de ser. Já a Laureline de Delevingne (por que diabo Luc Besson não lhe pintouo cabelo de ruivo?) vai sendo cada vez mais convincente à medida que o enredo lhe permite revelar a personalidade refilona e corajosa, embora tenha também um ar demasiado juvenil para o papel (só que é preciso atrair os adolescentes, em especial os americanos, que vão ao cinema em massa...).
A história de Valérian e a Cidade dos Mil Planetas é mais simplista do que qualquer uma dos álbuns da série, e a fita deixa-se por vezes emaranhar na sua exuberante teia narrativa. Mas o respeito pela BD original, a combinação de FC high tech e space opera da “velha escola”, e o arrojo visual de Besson (é o seu melhor trabalho desde Vertigem Azul), garantem uma experiência superior a qualquer filme estereotipado e tonitruante de super-heróis saído da salsicharia cinematográfica em que se transformou Hollywood.
Por Eurico de Barros