Isto de ter que resolver com limpeza num filme de duas horas e vinte minutos uma saga cinematográfica de ficção científica que já dura há várias décadas e chegou aos nove títulos (sem falar nas fitas paralelas e nas séries de televisão, animadas ou de imagem real, como a recente Mandalorian), não é coisa fácil. De dimensão mítica, cativou várias gerações, mobilizou centenas de milhões de espectadores em todo o planeta, movimenta orçamentos faraónicos e meios humanos e técnicos esmagadores, já passou pelas mãos de vários grandes estúdios e dá, sob várias formas, dos filmes aos milhentos produtos de merchandising, rendimentos na casa dos milhares de milhões de dólares.
J.J. Abrams, ele mesmo um grande fã da saga, conseguiu fazê-lo em Star Wars: Episódio IX-A Ascensão de Skywalker, que encerra (dizem eles, pelo menos) a saga Star Wars iniciada em 1977 por George Lucas com o primeiro filme daquilo que se tornariam três trilogias. O filme puxa todas as alavancas narrativas e emocionais certas, contempla todo o tipo de situações a que a saga nos habituou, desde duelos individuais a grandes batalhas, vai buscar velhos aliados e antigos inimigos para ajudarem ou desafiarem Rey e os seus amigos e companheiros no seu combate com a Primeira Ordem e os Sith, convoca personagens bem-amadas do passado, exibe na tela os 300 milhões de dólares que custou a rodar e, no final, deixa os fios da história todos bem atados e o título explicado.
Este é o lado mais conseguido e cumprido de Star Wars: Episódio IX-A Ascensão de Skywalker. Do lado menos, este é o filme, dos três desta trilogia final, que apesar de preservar todas as ligações ao universo criado por George Lucas mais pontos de contacto tem com o modelo das superproduções hoje dominante na indústria cinematográfica americana, do gigantismo desmesurado à narrativa atarefadíssima, que não dá um momento de descanso ao espectador, passando pela contaminação dos jogos de vídeo, dos filmes de super-heróis (a Força aqui é já um superpoder) e dos de fantasia (o covil do Imperador e dos Sith parece concebido por Tolkien). A grandeza épica original da saga ainda sobrevive em Star Wars: Episódio IX-A Ascensão de Skywalker. Mas está atenuada pelo materalismo impessoal e calculista da Hollywood de hoje. Tem tanto de filme de fã como é o seu realizador, como de director de marketing da Disney que o produz.
Por Eurico de Barros