Apesar de se inspirar num livro de Joyce Carol Oates, este filme de François Ozon multiplica-se em referências temáticas, visuais, psicológicas, atmosféricas a Cronenberg, De Palma, Lynch ou Polanski. Ozon é como uma esponja que absorve todas estas referências e depois as reorganiza e apresenta numa narrativa coerente, organizada e com a sua marca de cineasta que se deleita em variar de assunto, estilo e clima cinematográfico de fita para fita.
Em O Amante Duplo, Marine Vacth interpreta Chloé, uma rapariga que vive com o seu gato e sofre de estranhas dores de barriga. Vai consultar um psiquiatra, o lacónico e reconfortante Paul (Jérémie Renier), que a cura e pelo qual se apaixona, indo viver juntos. Um dia, na rua, Chloé descobre que Paul tem um gémeo, Louis (Renier de novo), também ele psiquiatra, mas com um feitio e métodos totalmente diferentes dos do irmão. Paul nunca lhe falou nele e Chloé acaba por se envolver com o irmão maléfico do seu angélico namorado.
Sugerindo e glosando o tema do “duplo”, da gemeidade e do desdobramento de personalidade ao longo de todo o filme, tanto pelas personagens de Paul e Louis, como pela insistência nos planos de reflexos em janelas e espelhos, e pelas características das obras de arte do museu onde Chloé trabalha, François Ozon insinua que pisamos terreno instável e movediço e que as aparências podem enganar, neste thriller mórbido, assombrado e, a espaços, laborioso a mais e afectado. Marine Vacth é soberba na obcecada e instável Chloé e Jérémie Renier quase só precisa de mudar de penteado para mudar de identidade.
Por Eurico de Barros