Um homen solitário, torturano e que não vê qualquer sentido ou utilidade naquilo que faz, decide recorrer à violência como forma de corrigir aquilo que entender serem os males do mundo e castigar os responsáveis por eles, assumindo assim uma aura de anjo vingador e sacrificial.
É a história de Taxi Driver, de Martin Scorsese, escrito por Paul Schrader, que este replica no seu novo filme, No Coração da Escuridão, em que Ethan Hawke interpreta não um taxista veterano do Vietname, mas um antigo capelão militar que é agora padre numa igreja histórica do estado de Nova Iorque. A congregação é muito pequena, e os turistas que a visitam são ainda menos.
De seu nome Ernst Toller, o sacerdote perdeu o filho no Iraque, a mulher divorciou-se dele, tem um tumor canceroso e foi abalado pelo morte súbita e violenta de um paroquiano. Além de fisicamente doente, Toller sente-se social e espiritualmente inútil, e a cair no desespero. E este primo direito do Travis Bickle de Taxi Driver toma uma decisão drástica, para concretizar no dia das comemorações dos 250 anos da sua igreja.
Paul Schrader tem uma relação tensa e conflituosa, de longa data, com a religião e a espiritualidade, manifestada em vários dos seus argumentos (basta recordarmos o de A Última Tentação de Cristo), e é o autor de um livro de referência sobre Dreyer, Ozu e Bresson e o cinema do transcendente que eles representam. Mas uma coisa é escrever sobre Dreyer, Ozu e Bresson, outra é fazer filmes como eles. E onde Taxi Driver resultava dramática e explosivamente, No Coração da Escuridão falha, por inverosímil, raso e caricatural. Nesta freguesia, a pregação de Schrader não colhe.
Por Eurico de Barros