STRANGE WORLD
Photograph: Disney

Estranho Mundo

Esta aventura passada num mundo imaginário, com ecos de ‘Viagem ao Centro da Terra’, revela uma crise de criatividade e identidade na animação da Disney.
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A Time Out diz

Aqueles que se interrogaram se a longa-metragem animada da Disney que se seguisse a Encanto ia ser ainda pior do que esta, têm a resposta bem clara em Estranho Mundo, realizado por Don Hall e Qui Nguyen: sim, é. Em Encanto, a Disney esforçou-se demasiado para corresponder ao que se esperava do estúdio após o medíocre e desinspirado Raya e o Último Dragão (a que Hall também esteve associado). E o resultado foi um filme com uma história tão complicada e laboriosa que até um adulto tinha dificuldade em a seguir, uma animação em apoteose de piroseira e canções e números musicais indiferentes.

Passado em Avalónia, um mundo imaginário com características steampunk, Estranho Mundo abandona (e ainda bem…) o registo musical, pretendendo ser uma homenagem aos velhos pulps e aos comics de aventuras de antanho. Há, mais uma vez, uma família no centro da história, os Clade, com grandes pergaminhos na exploração. Depois do seu pai, Jaeger Clade, ter desaparecido numa viagem exploratória por uma perigosa região gelada, Searcher Clade voltou as costas à tradição aventurosa da família, constituiu família e tornou-se agricultor, com enorme sucesso.

Searcher contribuiu decisivamente para o desenvolvimento de Avalónia, ao descobrir o pando, um vegetal verde que serve não só de alimento como também de combustível. Muitos anos depois do desaparecimento do pai, e agora já casado e com um filho, Searcher vai ter que acompanhar a presidente de Avalónia e uma equipa de compatriotas numa missão em que irão rumar a paragens incógnitas do país e procurar a origem da praga que está a afectar o pando, ameaçando deixá-los sem comida, combustível e energia. Após a partida, Searcher descobre que Ethan, o seu filho adolescente, e o cão da família, vêm como clandestinos na nave.

O argumento de Estranho Mundo glosa o barbudíssimo tema do conflito de gerações dentro da mesma família, integrando-o num enredo de aventura em que encontramos ecos de Viagem ao Centro da Terra. Só que numa versão mais “fofinha”, em que as extravagantes criaturas imaginárias do mundo interior de Avalónia substituem os animais pré-históricos do clássico de Júlio Verne, e que contempla uma reviravolta final que os mais atentos – e batidos nestas coisas do cinema – terão adivinhado com alguma antecipação.

Apesar do excêntrico e multicolorido ambiente em que se passa, e das peripécias que os protagonistas vivem nele, a história de Estranho Mundo não é lá muito empolgante. E se a intenção era fazer uma elaborada metáfora ecológica sobre a necessidade de zelarmos pelo bom estado do mundo em que vivemos, a conclusão é desconcertante, já que o elemento “verde” (o citado pando) é, afinal, prejudicial a Avalónia e aos seus habitantes. E ao querer, como diz o ditado, sol na eira e chuva no nabal, continuando a dar importância à família e aos seus valores de união e continuidade, mas introduzindo-lhe um forte elemento woke, a Disney arrisca-se a desagradar a gregos e troianos.

E temos ainda o problema da animação. Ainda mais do que em Encanto, o estúdio tenta, em Estranho Mundo, emular a criatividade e a audácia da sua subsidiária Pixar. Mas nem o mundo interior de Avalónia é particularmente impressionante ou fascinante, em termos visuais e na fauna que o povoa, nem a animação digital é convincente, transmitindo uma forte impressão sintética. As personagens são falhas de dimensão e há momentos em que parece estarmos a ver não uma longa-metragem de um estúdio com longos, históricos e brilhantes pergaminhos neste género, mas sim aqueles desenhos animados digitais feitos em série e onde tudo parece ser de borracha, que as televisões passam nos horários infantis.

Estranho Mundo revela uma Disney em crise de imaginação e de identidade, que parece não saber para onde ir, nem como. Da última vez que isto sucedeu, em finais da década de 80, apareceu um homem chamado Jeffrey Katzenberg, que levou a animação do estúdio a uma nova idade de ouro. Haverá outro como ele no horizonte?

Elenco e equipa

  • Realização:Don Hall, Qui Nguyen
  • Argumento:Qui Nguyen
  • Elenco:
    • Jake Gyllenhaal
    • Alan Tudyk
    • Jaboukie Young-White
    • Lucy Liu
    • Dennis Quaid
    • Gabrielle Union
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