Ao contrário do que o título possa indicar, o novo filme do polaco Paweł Pawlikowski, Óscar de Melhor Filme Estrangeiro com Ida (já antes, em Inglaterra, onde vive desde jovem, tinha assinado obras dignas de registo como A Última Oportunidade ou Amor de Verão), não é um thriller de espionagem ou político.
O que vamos aqui encontrar é uma história de amor agitada e ziguezagueante entre um homem e uma mulher, contada ao longo de vários anos entre o Leste totalitário e o Ocidente livre. A Guerra Fria é o pano de fundo e influencia o destino dos dois amantes ao longo de várias décadas, e apesar do severo preto e branco em que foi rodado, do que se trata aqui é de sentimentos que fervem, de corações em brasa.
Zula (Joanna Kulig) é uma jovem e Viktor (Tomasz Kot) está na casa dos 30 quando se encontram, em 1949, na altura em que a Polónia procura afirmar uma cultura popular socialista. Ela canta e dança, ele é compositor e músico e está a recrutar para um grupo folclórico. Apaixonam-se e vão-se encontrando, amando, zangando, separando e reencontrando, em sótãos em Paris, ruas da Berlim dividida e teatros na Jugoslávia.
Inspirando-se na história dos pais, em escassos 88 minutos, com apenas duas personagens, uma banda sonora mesclada de música folclórica polaca e jazz, e uma economia narrativa que só realça ainda mais a alta temperatura das emoções, Paweł Pawlikowski filma uma tragédia de amor ardente em tempos de rigorosa invernia ideológica. Joanna Kulig é irresistível na apaixonada, sensual e ínvia Zula. A actriz tem 36 anos, parece ter 18 ou 19 no início do filme, e à medida que este avança no tempo, imita-o até chegar à idade que tem na realidade, tudo sem a menor manipulação digital. O efeito especial é ela.
Por Eurico de Barros