Filme, Cinema, Drama, Céus do Libano (2020)
©DR Alba Rohrwacher de Céus do Libano

Crítica

Céus do Libano

3/5 estrelas
Em ‘Céus do Líbano’, a realizadora Chloé Mazlo conta uma história de família recorrendo a técnicas da animação. Ficámos conquistados.
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A Time Out diz

A certa altura de Céus do Líbano, Alice (Alba Rohrwacher) – uma jovem suíça que se instalou nos anos 50 em Beirute, no Líbano, como ama de uma família local –, tem uma violenta discussão ao telefone com os pais, que querem que ela volte para casa e não continue nesse distante país estrangeiro. A protagonista desta primeira longa-metragem de Chloé Mazlo desliga então o aparelho e corta, literalmente, com as suas raízes. Porque a realizadora filma-a, em animação fotograma a fotograma, a dar uma tesourada nas longas raízes que lhe saem dos pés.

Esta sequência define a aproximação de Chloé Mazlo à história que conta em Céus do Líbano: artesanal, naïf, com quase nada de naturalista e muito próxima do universo da animação de onde provém (a sua curta-metragem de estreia, Deyrouth, de 2010, tem bastantes pontos de contacto com esta fita). A realizadora foi inspirar-se na sua família para rodar Céus do Líbano, muito particularmente na história da sua avó Alice, que há mais de meio século deixou a Suíça para se instalar em Beirute, onde trabalhou e constituiu família.

Chloé Mazlo nunca se desvia da linha estética que escolheu para rodar o filme, quer esteja a recordar a activa e calorosa vida familiar e social de Alice, do marido, Joseph Kamar (Wajdi Mouawad), e da sua filha, com parentes e amigos, quer esteja a recriar as horas mais difíceis da guerra civil que eclodiu no Líbano em 1975, conduzindo o país à trágica situação em que se encontra hoje, devastando Beirute, outrora conhecida como “a Paris do Médio Oriente” e acabando com a existência plácida e feliz de Alice, da sua família e dos seus próximos, muitos dos quais foram obrigados a deixar o Líbano e ir para o estrangeiro.

Há alturas de Céus do Líbano, sobretudo a partir do momento em que a guerra se instala, em que sentimos que esta predilecção não-realista de Chloé Mazlo, composta por sequências animadas, cenários pintados, fundos projectados, um registo fantasioso, muito simbolismo óbvio (a rapariga vestida de cedro, que é a árvore e o símbolo nacional do Líbano, os políticos que usam máscaras de animais diversos) e uma personalidade visual de fotografia a cores dos anos 60 e 70 tirada do álbum familiar para mostrar às visitas, parece ligeira e frívola demais para a gravidade do assunto que o filme está a evocar e dramatizar.

No entanto, Mazlo consegue manter a homogeneidade formal e de tom do filme, que está muito centrado nos efeitos do conflito em Alice, nos familiares e na vida dos amigos (boa parte de Céus do Líbano passa-se no interior do espaçoso apartamento dos Kamar, sempre de portas abertas para parentes e amigos, primeiro nos bons momentos e depois nos maus, e que recebe também as visitas indesejáveis das milícias rivais que combatem nas ruas da capital) e não inclui grandes e dispendiosas recriações dos acontecimentos que evoca. E cuja identidade, mesmo nas horas mais melancólicas e sombrias, tem as cores da nostalgia, que se mantêm vivas até ao fim. Mesmo quando Alice tem que deixar Beirute por Paris, e se vê obrigada a cortar com as suas segundas e mais recentes raízes, à luz das estrelas do seu país adoptivo.

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