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Há aquela velha história do marido que sai para comprar cigarros depois do jantar e nunca mais volta. Em Asako I & II, de Ryûsuke Hamaguchi (o autor do soberbo Happy Hour: Hora Feliz), Baku (Masahiro Higashide), o namorado da jovem Asako (Erika Karata), sai um dia para comprar sapatos e não regressa.
O belo, sedutor e cool Baku desaparece da vida dela tão subitamente como entrou, depois de se terem cruzado numa exposição de fotografia, em Osaka, e de cá fora ele a ter beijado, quase sem terem falado antes. O melhor amigo de Baku, já tinha avisado Asako que ele era um namoradeiro irresponsável, mas a rapariga estava cega de paixão (Hamaguchi deixa implícito que é o primeiro amor a sério dela) e não lhe ligou.
Dois anos mais tarde, o filme mudou-se, tal como Asako, para Tóquio, onde a jovem trabalha num café, e encontra Ryôhei (também interpretado por Masahiro Higashide), um executivo de uma firma que comercializa saké e que é a cara chapada de Baku.
Fascinada pela parecença, Asako inicia uma relação com Ryôhei, que é, em personalidade e feitio, o oposto polar de Baku, atencioso, responsável e maduro, sem nunca lhe falar deste e da quase sobrenatural semelhança entre ambos.
O tempo passa. Asako e Ryôhei parecem um casal feliz, têm um pequeno e fiel círculo de amigos e a impressão de que ela se apaixonou por Ryôhei mais por ver nele a imagem do namorado desaparecido, do que pelas suas qualidades, parece ter-se esvaído. Só que um dia, Asako olha para um cartaz publicitário e depara com uma cara conhecida.
Apoiando-se num romance da sua compatriota Tomoka Shibasaki, Ryûsuke Hamaguchi assina aqui um filme sensibilíssimo, delicadamente elíptico e de grande decoro emocional, sobre o confronto entre a idealização romântica e a realidade concreta e quotidiana da paixão e das relações sentimentais, e sobre os acasos, os inesperados, as ilusões e a componente irracional do amor.
A diáfana Karata e o camaleónico Higashide são notáveis, e a conclusão de Asako I & II, em que Hamaguchi filma Asako e Ryôhei a comentar de forma totalmente diferente uma mesma realidade, é um exemplo brilhante de como um filme pode ter um final feliz com muita mágoa apensa.
Por Eurico de Barros