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Isto de uma pessoa se dar, mais ou menos, de cama e pucarinho, com uma mulher grávida de um lobisomem tem os seus problemas. Maiores, contudo, são os trabalhos em que a pessoa se mete quando se põe a cuidar de um monstrinho, qual alien, acabado de explodir da barriga da mãe.
O instinto maternal vai ser a cruz de Clara (Isabél Zuaa), mas por enquanto ela é apenas uma desesperada à procura de emprego. Que encontra, trabalhando para Ana (Marjorie Estiano), ao princípio como ama da criança por nascer, na prática acumulando com empregada doméstica, assistente de compras, amante e, quando o sonambulismo da patroa mostra que algo está errado, cuidadora empenhada em que nada dê para o torto. Isto, no entanto, é só a introdução. O prato de substância vem depois e, sem querer estragar a história, pode resumir-se assim: não é pêra doce cuidar de um jovem licantropo (Miguel Lobo), principalmente quanto ele ganha consciência da sua identidade.
Se até aqui o filme de Juliana Rojas e Marco Dutra insinu uma crítica ao sistema de classes e à segregação racial e social no Brasil, daqui em diante o par de cineastas investe descaradamente na materialização do horror. A maneira como o fazem, porém, apesar das suas fraquezas, geralmente dadas ao exibicionismo plástico em sequências tão longas como vazias, é o mais estimulante da fita, pois Rojas e Dutra montam, como um lento rodopio hipnótico e algo alucinado, uma feira de atracções onde a superstição popular se mistura com a banda desenhada e o musical, assim criando uma narrativa coerente, aqui e ali, também surpreendente.
Por Rui Monteiro