Na força de A Fábrica de Nada – não querer ser só um filme que conta a história, linear, convencional, naturalista, arrumadinha, de uma fábrica em risco de fechar e que os seus trabalhadores querem salvar – reside também a sua fraqueza – querer ser várias coisas numa só, e em cambulhada. Uma ficção chegadinha à realidade; um documento social; uma reflexão sobre o mundo laboral de hoje e de amanhã, com o advento da robótica, sobre a viabilidade da autogestão e o futuro do capitalismo; um ensaio sobre o país e o mundo em que vivemos agora; e até um micromusical.
É um filme tão atarefado, tão empenhado em discutir, reflectir, explorar, que traz embutido o desconcerto dos seus autores (apesar de realizado por Pedro Pinho, tem a autoria partilhada por todos que o escreveram), mostra gente que lhe é exterior a discutir os problemas que aborda e até tem um “grilo falante”, na pessoa de um documentarista italo-argentino que cai de pára-quedas e passa o tempo ora a acompanhar e a falar com as personagens, ora a comentar o que se vai passando. Não admira que, com todo este arrojo formal e esta superabundância de palheta, A Fábrica de Nada dure três horas. E que por vezes desejemos que esta obra colectiva e mutante tivesse tido um produtor batido e mandão, daqueles que sabem onde está a ganga de um filme e pedem para a cortar.
Por Eurico de Barros