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A primeira longa-metragem de Jonas Carpignano, Mediterrânea (2015), tinha tanto de carga de boas intenções sobre os africanos que viajam ilegalmente para Itália em condições precárias e perigosas, como de carência de forma narrativa e fibra dramática.
A Ciambra, a nova realização de Carpignano, passa-se na Calábria, a mesma zona de Itália a que aportavam os migrantes de Mediterrânea. Mas o realizador vira agora a sua atenção para uma comunidade cigana local, cujos membros interpretam versões ficcionadas deles próprios, e não convivem bem quer com os africanos, quer com os próprios italianos.
São francamente racistas para com aqueles e desprezam estes, embora, para ter dinheiro, estejam às ordens dos mafiosos, que os usam como “infantaria” da delinquência de proximidade (roubo de automóveis, bagagem e mochilas, pequena extorsão, assaltos a casas, etc.).
Se a Mediterrânea faltava também um ponto de vista firme, ele existe agora em A Ciambra, na pessoa de Pio (Pio Amato, que já aparecia naquele filme), um rapaz cigano de 14 anos. Pio ambiciona seguir o irmão mais velho na vida de crime e travou amizade com Ayvia, vindo do Burkina Faso. O curso dos acontecimentos irá pô-lo perante uma escolha que definirá o seu futuro.
Inevitavelmente devedor da tradição neo-realista do cinema transalpino, A Ciambra é também representativo de um cinema independente e com preocupações políticas que se faz hoje na Europa.
Tudo isto estaria muito bem se não sentíssemos que o realizador, além de usar e abusar da câmara peripatética e grudada nas personagens, está, laboriosamente, a contemplar todas as rubricas do caderno de encargos do filme de intervenção e preocupação social, enquanto exibe em simultâneo, e sem a menor subtileza, a mochila bastante esfarrapada do realismo documental cru e gutural.
E tal como já sucedia em Mediterrânea, Jonas Carpignano não tem, em A Ciambra, argumentos suficientes para justificar as quase duas horas de duração. Nem o jovem Pio, com toda a força da sua espontaneidade, consegue impedir que a fita acabe por fatigar o espectador mais disponível.
Por Eurico de Barros