A Time Out na sua caixa de entrada

Procurar
Ex-Centro Social e Cultural de Santa Engrácia
Francisco Romão PereiraEx-Centro Social e Cultural de Santa Engrácia

De uma ocupação, nasceu o Centro Social e Cultural de Santa Engrácia. Será o despejo o seu fim?

No dia 25 de Abril, enquanto milhares celebravam na Avenida da Liberdade, um edifício era ocupado na freguesia de São Vicente. O despejo pela polícia aconteceu uma semana depois, mas há uma petição a circular.

Rute Barbedo
Escrito por
Rute Barbedo
Publicidade

Rua Bartolomeu da Costa, número 2, quase a chegar à zona de Sapadores. Na casa de dois andares, com um amplo espaço exterior e árvores generosas, chegaram a funcionar um lactário e um centro de apoio à infância. Em 2010, no entanto, as portas fecharam-se e assim ficaram durante anos, até ao passado 25 de Abril, em que um movimento de cidadãos decidiu ocupá-la para ali criar o Centro Social e Cultural de Santa Engrácia.

Ex-Centro Social e Cultural de Santa Engrácia
Francisco Romão PereiraEx-Centro Social e Cultural de Santa Engrácia

Durante uma semana, limparam-se interiores e exteriores do edifício, houve concertos, oficinas, circo, jogos, leituras, conversas, filmes, refeições gratuitas e assembleias diárias abertas a quem se quisesse juntar (vizinhos inclusive) à missão do movimento Okupar Abril. A 2 de Maio, a polícia obrigou os ocupantes a abandonar o local e vedou as entradas à propriedade. O colectivo, no entanto, diz que não vai desistir do projecto e fez circular uma petição pela cedência permanente do espaço, que conta com mais de 2200 assinaturas. “Queremos que este espaço de apoio mútuo, convívio, cultura e serviço ao bairro continue a existir nesta localização, em vez de dar lugar a mais especulação imobiliária”, lê-se no documento.

Actividades durante a ocupação
Instagram/Okupar AbrilActividades durante a ocupação

Do apoio à infância à habitação

O edifício é propriedade da Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) Fundação D. Pedro IV “desde o final do século 19” e terá sido “doado por um emigrante português na América”, segundo explicou ao jornal Expresso o presidente da instituição, Vasco Canto Moniz, que refere que o seu encerramento, em 2010, foi motivado “por falta de condições”. A fundação apresentou, então, um projecto de habitação “não social” à Câmara Municipal de Lisboa, que terá emitido um despacho favorável em 2013, segundo o mesmo responsável. Episódios seguintes: “Apresentámos o projecto de arquitectura, foi mandado alterar, discordámos, tivemos sérias dificuldades, mas finalmente em Outubro [de 2023] recebemos aprovação final”, explica ao mesmo jornal. E o que fará a fundação com o valor recebido pela venda do edifício de 17 apartamentos? “Potenciar os projectos de acção social” da instituição, responde Vasco Moniz. Mas, para o movimento Okupar Abril, este é mais um caso de gentrificação em Lisboa.

Inspirados pelas ocupações pós-25 de Abril

Lembrando a leva de ocupações que aconteceu no pós-revolução e o mantra eternizado por José Afonso, "o povo é quem mais ordena", não foi por acaso que o movimento de cidadãos escolheu a data de 25 de Abril para entrar no edifício. Nas redes sociais, o Okupar Abril lembra episódios com quase 50 anos, como a criação da Clínica Popular Comunal da Cova da Piedade por via da ocupação de um palácio ou de um parque infantil na Quinta das Conchas pela Comissão de Moradores do Lumiar.

“Hoje, 50 anos após o 25 de Abril, lembramos as ocupações, as comissões de moradores, as assembleias populares onde a revolução se concretizava. Lembramos o povo que, unido e organizado, ocupou espaços para habitação, apoio mútuo, lazer…”, escrevem, argumentando que também no Centro Social e Cultural de Santa Engrácia “reuniram-se todos os dias centenas de pessoas de todas as idades e vindas de todas as partes”. Para os agora ex-ocupantes, embora o edifício seja propriedade privada, era um local abandonado há quase 15 anos e o despejo aconteceu “sem aviso e sem diálogo”. Mantendo o projecto aceso, avisam que, apesar da acção das autoridades, “nunca conseguirão despejar uma ideia, um sonho e a vontade colectiva de criar um espaço auto-gerido de apoio mútuo aberto à população”.

Sessão de cinema no edifício
Instagram/Okupar AbrilSessão de cinema no edifício

No dia seguinte ao despejo, 3 de Maio, o Okupar Abril participou na Assembleia da Junta de freguesia de São Vicente “para lembrar aos poderes locais que o povo é quem mais ordena” e que o bairro precisa de um lugar dedicado à partilha e à cultura. "Não queremos que fique por aqui (...). Queremos oferecer actividades como pintura e cerâmica, uma cantina social, convívios para partilha de histórias e jogos de tabuleiro e cartas, um jardim e horta comunitários, uma loja livre, um circo social e acompanhamento e segurança no bairro”, escrevem.

Edifício durante a ocupação
Instagram/Okupar AbrilEdifício durante a ocupação

Em declarações ao Expresso, a Fundação D. Pedro IV refere que a ocupação de 25 de Abril de 2024 foi denunciada por vizinhos, que terão sido incomodados pelo ruído produzido no local. O colectivo, por sua vez, argumenta ter “o apoio da vizinhança.”

Siga o novo canal da Time Out Lisboa no Whatsapp

+ Neste mercado não se compram batatas, trocam-se ideias para o futuro

Últimas notícias

    Publicidade